PENSAMENTOS ANTERIORES A POPPER[1]
Desde a Antiguidade o critério que define a ciência vem sendo discutido.
Entre os gregos o problema que se colocava era a diferença entre opinião e
ciência, pois eles tinham a necessidade de adotar um discurso coeso acerca do
que se podia demonstrar; isto era paralelo ao saber contingente.
Schmidt e Santos apontam que o pensamento filosófico ocidental, antes de
Popper, aplicou-se em descobrir o porquê dos constantes erros encontrados em
suas pesquisas, baseado na crença da evidência da verdade. Estes autores também
lembram Descartes, o qual defende que premissas verdadeiras imunizam a pesquisa
de conclusões falsas ou duvidosas; a evidência seria o critério de verdade.
Para este autor, o cientista deve se desfazer de ideias preconcebidas e sem
fundamentos, ele, então, partiria da observação, da auto evidência.
No século XX, com a queda do sistema teórico da física newtoniana, fato
que estarreceu a comunidade científica da época, o positivismo lógico sofreu
duras críticas. Este então, pregador do conhecimento seguro pela experiência,
deflagrou fortes questionamentos a metafísica, com intuito de salvaguardar o
significado a partir do verificável.
POPPER: UMA POSTURA CONTRÁRIA AO
INDUTIVISMO
Karl Popper, em sua obra fundamental A Lógica da Pesquisa Científica,
introduz uma nova discussão epistemológica, onde a realidade é inteligível e
cabe ao homem ordená-la. Então, a partir de tentativas e erros, visto que o
homem sempre aprende com os seus erros, eleva tal categoria a um patamar
superior, afirmando que tal experiência é responsável pela mobilidade da
ciência, servindo como força propulsora. Então, para tal fim, nega com profunda
radicalidade o princípio da indução como método do procedimento científico,
pelo simples fato de que uma futura constatação poderá contradizer a todas as
anteriores. Desse modo, conforme já afirmado por Hume, abandona-se a ideia de
que se pode fundamentar um enunciado universal a partir dum particular. Com
isso, pode-se dizer que enunciados singulares não podem atestar uma teoria.
Para Popper a ciência é feita através da construção de hipóteses,
teorias e conjecturas, fruto da imaginação criadora do homem, que o aproxima
cada vez mais da verdade. Portanto, trata-se de uma construção racional e
histórica, pois os homens agem e pensam tendo como referência o tempo em que
vivem. Tal feito dá-se pela não cristalização das teorias, de modo a
compreender a naturalidade em que se substituem teorias menos satisfatórias por
aquelas que contemplem maior conteúdo. Então, através do critério da
falseabilidade, estabelece o que é ciência e o que é metafísica. Com isso, toda
proposição que puder ser refutada com experiência empírica é científica. De
modo que acontecendo o contrário, será metafísica.
Acontece que com Popper todo teoria deve ser questionada de modo a ver
se suporta as mais diversas refutações, desse modo, quanto mais for refutada,
melhor será a teoria.
CRÍTICAS AO PENSAMENTO POPPERIANO
Este capítulo evidencia debates filosóficos, algumas opiniões de Popper
e de críticos ao pensamento do autor. As seguintes críticas evidenciadas são do
professor Thomas S. Kuhn, ele contesta quando afirma que o cientista é um
solucionador de problemas. A ciência só parte destes, eles aparecem quando
demonstram que há algo de errado frustrando as expectativas, ou quando se há
dificuldades e contradições.
Segundo Kuhn, os cientistas são solucionadores de enigmas e não de
problemas. O termo enigma tem o objetivo de enfatizar que as dificuldades que
costumeiramente são enfrentadas pelos cientistas são como enigmas de palavras
cruzadas ou de charadas de xadrez, desafios apenas ao seu engenho, pois para
ele a dificuldade é do cientista e não da teoria, ele afirma que a posição é
quase contraria a de Popper.
Outra questão é os testes na substituição teorias científicos, mas
algumas teorias foram substituídas sem antes terem sido testadas. A tese
proposta por Popper de que se pode aprender com nossos erros, pois é errada
para Kuhn, não é compreensível que um erro se possa se transforma em saber.
Para Kuhn, o máximo que se pode
afirmar a este aspecto é que uma teoria que não era um erro passou a sê-lo, ou
por outro lado, que um cientista errou ao obstinar-se a uma teoria por um tempo
muito longo. Consoante, assevera Kuhn, o que Popper nos deu não foi uma lógica
do conhecimento, mas uma ideologia e em lugar de regras metodológicas, ofereceu
aforismos de procedimento.
A ciência normal, para Kuhn, seria a desempenhada por um cientista, ou
seja, aquele que acolhe o dogma dominante do dia, que não deseja contestá-lo e
que só aceita uma teoria revolucionária, quando a maioria dos membros da
comunidade a que pertence está pronta para aceitá-la.
Estas poucas diferenças de opinião entre Kuhn e Popper — certamente não
tentamos esgotar o assunto nem, tampouco, apresentar todos os pontos
divergentes entre ambos — têm como intuito incrementarmos a erudição acerca do
pensamento popperiano.
[1] Karl Raimund
Popper (Viena, 28 de Julho de 1902 — Londres, 17 de Setembro de 1994) foi um
filósofo da ciência austríaco naturalizado britânico. É considerado por muitos
como o filósofo mais influente do século XX a tematizar a ciência 1 . Foi
também um filósofo social e político de estatura considerável, um grande
defensor da democracia liberal e um oponente implacável do totalitarismo. Ele é
talvez mais bem conhecido pela sua defesa do falsificacionismo como um critério
da demarcação entre a ciência e a não-ciência, e pela sua defesa da sociedade
aberta.
Biografia
Nascido numa família de classe alta de origem
judaica secularizada, foi educado na Universidade de Viena. Concluiu o
doutoramento em filosofia em 1928 e ensinou numa escola secundária entre 1930 e
1936. Em 1937, a ascensão do Nazismo levou-o a emigrar para a Nova Zelândia,
onde foi professor de filosofia em Canterbury University College, Christchurch.
Em 1946, foi viver na Inglaterra, tornando-se assistente (reader) de lógica e
de método científico na London School of Economics4 , onde foi nomeado
professor em 1949. Foi nomeado cavaleiro da Rainha Isabel II em 1965, e eleito
para a Royal Society em 1976. Reformou-se da vida académica em 1969, apesar de
ter permanecido activo intelectualmente até à sua morte, em 1994. Recebeu a
insígnia de Companheiro de Honra (Companion of Honour) em 1982. Popper recebeu
vários prémios e honras no seu campo, incluindo o prémio Lippincott da
associação americana de ciência política, o prémio Sonning, e o estatuto de
membro na sociedade real, na academia britânica, London School of Economics,
Kings College de Londres e o Darwin College de Cambridge.
A filosofia de
Popper
Popper cunhou o termo "Racionalismo
Crítico" para descrever a sua filosofia. Esta designação é significante e
é um indício da sua rejeição do empirismo clássico e do
observacionalismo-indutivista da ciência, que disso resulta. Apesar disso, alguns
académicos, incluindo Ernest Gellner, defendem que Popper, não obstante não se
ter visto como um positivista, se encontra claramente mais próximo desta via do
que da tradição metafísica ou dedutiva. Popper argumentou que a teoria
científica será sempre conjectural e provisória. Não é possível confirmar a
veracidade de uma teoria pela simples constatação de que os resultados de uma
previsão efectuada com base naquela teoria se verificaram. Essa teoria deverá
gozar apenas do estatuto de uma teoria não (ou ainda não) contrariada pelos
factos. O que a experiência e as observações do mundo real podem e devem tentar
fazer é encontrar provas da falsidade daquela teoria. Este processo de
confronto da teoria com as observações poderá provar a falsidade da teoria em
análise. Nesse caso há que eliminar essa teoria que se provou falsa e procurar
uma outra teoria para explicar o fenómeno em análise. (Ver Falseabilidade). Em
outras palavras, uma teoria científica pode ser falsificada por uma única
observação negativa, mas nenhuma quantidade de observações positivas poderá
garantir que a veracidade de uma teoria científica seja eterna e imutável. Alguns
consideram este aspecto fulcral para a definição da ciência, chegando a afirmar
que "científico" é apenas aquilo que se sujeita a este confronto com
os factos. Ou seja: afirmam que só é científica aquela teoria que possa ser
falseável (refutável). Existem críticas contundentes quanto a esse aspecto.
Essas remanescem no bojo da própria Filosofia que Popper propõe. E por quê? Ao
afirmar que toda e qualquer teoria deve ser falseável, isso se aplica à própria
teoria da falseabilidade popperiana. Portanto, a falseabilidade deve ser
falseável em si mesma. Diante dessa evidente necessidade - sob a pena de sua
teoria ser não-universal e portanto derrogada pela sua imprecisão - poderá
existir proposições em que a falseabilidade não é aplicável (vide teorema da
incompletude de Kurt Gödel). Nos dias de hoje, verifica-se que o
falsificacionismo popperiano não é princípio de exclusão, mas tão somente de
atribuição de graus de confiança ao objecto passível do crivo científico.
Outros argumentam que estas críticas não fazem sentido devido a teoria de
Popper não ser científica, por não se ocupar de fatos contingentes. Para Popper
a verdade é inalcançável, todavia devemos nos aproximar dela por tentativas. O
estado actual da ciência é sempre provisório. Ao encontrarmos uma teoria ainda
não refutada pelos fatos e pelas observações, devemos nos perguntar, será que é
mesmo assim ? Ou será que posso demonstrar que ela é falsa ? Einstein é o
melhor exemplo de um cientista que rompeu com as teorias da física
estabelecidas. Popper debruçou-se intensamente com a teoria Marxista e com a
filosofia que lhe é subjacente, de Hegel, retirando-lhes qualquer estatuto
científico. O mesmo em relação à psicanálise, cujas teorias subjacentes não são
falseáveis (refutáveis). O seu trabalho científico foi influenciado pelo seu
estudo da teoria da relatividade de Albert Einstein.
O paradoxo da
tolerância
Embora Popper tenha sido um defensor da
tolerância, ele disse que a intolerância não deve ser tolerada, pois se a
tolerância permitir que a intolerância tenha sucesso completamente, a própria
tolerância estaria ameaçada. Em seu livro A
sociedade aberta e seus inimigos, ele argumentou: "A tolerância ilimitada leva ao
desaparecimento da tolerância. Se estendermos a tolerância ilimitada, mesmo
para aqueles que são intolerantes, e se não estamos preparados para defender
uma sociedade tolerante contra o ataque dos intolerantes, então os tolerante
serão destruídos e tolerância com eles. - Esta formulação, não implica que
devemos sempre suprimir as filosofias intolerantes, contanto que possamos
combatê-las por argumentos racionais e mantê-las sob controle pela opinião
pública. Mas devemos reivindicar o direito de suprimi-las, se necessário até
mesmo pela força, e isso pode facilmente acontecer se elas não estiverem
preparadas em debater no nível de argumentação racional, ao começar por
criticar todos os argumentos e proibindo seus seguidores de ouvir argumentos
racionais, devido ela ser uma filosofia enganosa, ensinando-os a responder a
argumentos com uso de punhos ou pistolas. Devemos, portanto, reivindicar, em
nome da tolerância, o direito de não tolerar os intolerantes. Devemos enfatizar
que qualquer movimento que pregue a intolerância deva ser colocado fora da lei,
e devemos considerar a incitação à intolerância e perseguição devido a ela,
como criminal, da mesma forma como devemos considerar a incitação ao assassinato,
ou seqüestro, ou para a revitalização do comércio de escravos como criminoso”.
De comunista a
liberal
Popper foi membro ativo do Partido Comunista da
Áustria mas, quando questionou os líderes do partido sobre a morte de vários
colegas em uma manifestação, ele obteve a resposta de que foram necessárias
para se realizar a revolução, o que o marcou profundamente e, a partir daí,
começou a questionar a ideologia marxista. Com o tempo, Popper refutou
completamente o Marxismo e tornou-se um liberal. Em 1947, Popper fundava com
Friedrich Hayek, Milton Friedman, Ludwig von Mises e outros a Sociedade Mont
Pèlerin para defender o Liberalismo clássico, no espírito do Open Society.
Diferenças
entre Popper e Francis Bacon
Comparando o método científico de Karl Popper
com a visão baconiana da ciência, Ernest Gellner afirma em "Relativism and the social sciences"
("Relativismo e as ciências sociais"):
"a definição do método científico de
Popper difere da versão baconiana de empirismo por sua ênfase na eliminação em
vez da ênfase na verificação. No entanto eles têm em comum um determinado
ponto: quer nós verifiquemos ou refutemos, de qualquer forma fazêmo-lo com a
ajuda de duas ferramentas e apenas duas: a lógica e a confrontação com os
factos. As teorias são julgadas por dois juízes: consistência lógica e
conformidade com os factos. A diferença entre os dois modelos situa-se apenas
em saber se os factos condenam os pecadores ou canonizam os santos. Para o
jovem Popper havia alguns pecadores apropriadamente certificados, mas nunca
santos definitivamente canonizados".
Livros
traduzidos
A sociedade aberta e seus inimigos (2 volumes).
São Paulo, EDUSP, 1974; Conhecimento objetivo: uma abordagem evolucionária. São
Paulo, ed. da Universidade de São Paulo, 1975; A lógica da pesquisa científica.
São Paulo, Cultrix, 1993; O realismo e o objectivo da Ciência (1o volume do
pós-escrito à Lógica da descoberta científica). Lisboa, Publicações Dom
Quixote, 1987; O universo aberto – argumentos a favor do indeterminismo (2o
volume à Lógica da descoberta científica). Lisboa, Publicações Dom Quixote,
1988; A Teoria dos Quanta e o cisma na física (3o volume do pós-escrito à
Lógica da descoberta científica). Lisboa, Publicações Dom Quixote, 1989; Conjecturas
e refutações (O progresso do conhecimento científico). Brasília, Editora da
UNB, 1994; Em busca de um mundo melhor. Lisboa, Fragmentos, 1989; Um mundo de propensões. Lisboa, Fragmentos,
1991; O racionalismo crítico na política. Brasília, Editora UNB, 1994; Televisão:
um perigo para a democracia. Lisboa, Gradiva, 1995; Autobiografia intelectual.
Brasília: UnB, 1977. 263p. (B); La miséria del historicismo. Madrid: Taurus
Ediciones; Alianza Editorial, c1984. 181p. (B); O eu e seu cérebro. Campinas:
Papirus; Brasília: UnB, 1991. 513p. (B); Sociedade aberta, universo aberto.
Lisboa: Dom Quixote, 1987. 112p. (B) ; A miséria do Historicismo. Tradução de
Octany S. Mota e Leônidas Hegenberg. - São Paulo: Cultrix: Ed. da Universidade
de São Paulo, 1980.
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